Uma nova lei vai dar, ao cidadão e
cidadã brasileiras afundadas em dívidas, uma nova chance de se reerguer
financeiramente, sem deixar de pagar os empréstimos e os crediários em aberto.
Em vez de procurar uma financeira para contrair uma nova dívida, a pessoa vai
procurar o Tribunal de Justiça em seu estado.
Em uma mesma mesa, estarão a pessoa que
deve, as pessoas e empresas que querem receber e um profissional de
conciliação. Todos serão convocados por um Juízo para negociar um único plano
de pagamento das dívidas, em condições que não comprometerão a sobrevivência da
pessoa que perdeu a capacidade de honrar seus compromissos financeiros ou da
família. A conciliação, que hoje é usada na Justiça para resolver uma dívida de
cada vez, vai permitir acordos entre um devedor e seus vários credores, com a
chamada Lei do Superendividamento, sancionada este mês.
A conciliação é uma política nacional
do Poder Judiciário desde 2010, instituída pelo Conselho Nacional de Justiça
(CNJ). Embora não haja um número total de superendividados no país, eles estão
entre os 62,5 milhões de brasileiros com dívidas, de acordo com o mais recente
Mapa da Inadimplência da Serasa. E a crise econômica fruto da pandemia da
Covid-19 pode fazer crescer esse número.
“A conciliação é um dos pilares da nova
lei. Esse tratamento do superendividamento já existe em inúmeros países, com
sociedades democratizadas de crédito, como Estados Unidos, Canadá, Japão e em
países da Europa. Todos têm um regramento e nós não tínhamos. Quem perdesse emprego
ou que ficasse doente ou se separasse, enfim, alguém que tivesse um desses
acidentes da vida não tinha saída”, afirma a magistrada do TJRS.
Solução pela conciliação
“Há todo um ambiente que induz o
brasileiro a buscar a justiça para resolver até as menores desavenças. Com as
mudanças legislativas, estamos buscando uma mudança de cultura. Isso é o mais
importante e já está acontecendo”, destaca o conselheiro do Conselho Nacional
de Justiça (CNJ) Marcos Vinicius Jardim Rodrigues, que é presidente da Comissão
Permanente de Solução Adequada de Conflitos.
Os Centros Judiciários de Resolução de
Conflitos e Cidadania a Justiça (Cejuscs) são o setor da Justiça brasileira
dedicada a soluções negociadas que evitem, sempre que possível, a criação de um
processo judicial. Em 2019, de acordo com o último anuário estatístico
produzido pelo CNJ, em 2019, os tribunais brasileiros tinham 1.284 unidades
instaladas. A Lei 14.841/2021 entrou em vigor no início do mês e os tribunais
ainda estão estruturando suas ações para criar unidades para receber esse
público específico.
Como funciona
De acordo com a nova lei, a pessoa
superendividada deve procurar a Justiça do seu estado, que deverá encaminhá-lo
ao núcleo de conciliação e mediação de conflitos oriundos de superendividamento.
Atualmente, alguns tribunais de Justiça (Bahia, Distrito Federal, Paraná,
Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo) já oferecem o serviço a esse público
específico. Acompanhado ou não de um representante legal, a pessoa deverá
informar ao Juízo suas dívidas e condições de sobrevivência, especificando
valores e para quem deve.
Credores e credoras serão então
convocadas para participar da audiência de conciliação, em que a pessoa
endividada irá propor o seu plano de pagamento. A lei determina que credores ou
seus representantes compareçam à audiência com poder de decisão, ao contrário
do que ocorre atualmente. Caso contrário, a cobrança da dívida será suspensa,
assim como respectivos juros e multas. E mais: credores e credoras que faltarem
ao chamado da Justiça ficarão de fora do plano de pagamento daquela dívida, até
que a pessoa devedora acabe de pagar todas as dívidas em que firmou acordo no
dia da audiência.
Manuel Carlos Montenegro
Agência CNJ de Notícias